A Constituição Federal garantiu que a assistência social fosse destinada a toda pessoa a quem dela necessitar, e como vimos anteriormente, a garantia na forma da lei não bastava para sua plena efetivação, havia ainda um longo caminho para que a população tivesse acesso a esse direito, livre dos resquícios assistencialistas, produto de um processo histórico vivido pelo país.
Na lógica do sistema de reprodução capitalista, estava subsidiado com a proteção social quem estivesse beneficiado com trabalho, para quem estava fora, ficava a margem da benesse, e romper com esta “ética capitalista” era um trajeto que estava só por se iniciar.
A Política Nacional de Assistência Social foi direcionada pelos marcos normativos que embasaram sua construção, suas diretrizes, estabelecendo as responsabilidades de cada ente, em cada esfera de governo, para sua plena execução em âmbito nacional.
Para nossa análise, vamos relembrar que a LOAS estabelece em seu artigo 2º, os objetivos da Política de Assistência Social, sendo eles: Proteção Social, Vigilância Socioassistencial e Defesa de Direitos, bem como estes mesmos critérios expressos na NOB/SUAS 2012 em seu artigo 1º, que estabelece o SUAS e seu funcionamento; estes servirão de escopo neste diálogo.
A NOB/SUAS apresenta para efetivação da Assistência Social na direção de garantir os objetivos e funções citados acima, percursos a se atingir a proteção social, destinada à população brasileira.
Para o SUAS, garantir a proteção social à população, está diretamente ligada a oferta de serviços, programas, projetos e acesso a benefícios socioassistenciais, visando a proteção à vida, redução de danos e prevenção de incidência de riscos sociais, de maneira não contributiva, participativa e livre de contrapartida.
Nesta vertente, o SUAS estabelece do artigo 2º até o artigo 7º os elementos centrais para implementação e execução dos objetivos apresentados.
Hoje vamos dialogar sobre o artigo 4º da NOB/SUAS, as Seguranças Afiançadas por este sistema: Acolhida, Renda, Convívio ou Vivência Familiar, Comunitária e Social, Desenvolvimento de Autonomia e Apoio e Auxílio.
- A Acolhida é o processo que se estabelece em ambas as proteções: básica e especial, no atendimento/acompanhamento qualificado da população. Isto ocorre desde o momento da entrada do usuário ao equipamento do SUAS, até o atendimento ético-técnico da demanda apresentada.
O processo de acolhida se inicia com a garantia de que a demanda do usuário será recebida com respeito, com resguardo sigiloso, com escuta qualificada, com acesso as informações atinentes à sua demanda e aos direitos existentes, com registro do apresentado em prontuários de acesso exclusivo aos profissionais de nível superior, envolvidos nos atendimentos e acompanhamentos destinados aos usuários.
Para que seja efetivada esta segurança, os gestores municipais precisam garantir as condições físicas de execução, oferta contínua de programas e benefícios socioassistenciais e ainda educação permanente aos profissionais do SUAS.
A Segurança de Acolhida também se efetiva na forma de oferta de acolhimento institucional quando a população usuária enfrenta situações de rompimento dos vínculos familiares, necessitando de acolhimento institucional, de caráter temporário, com vistas a emancipação e superação do fato que culminou no acolhimento, e sempre visando o resgate e reconstrução destes vínculos.
Cumpre mencionar que a acolhida além de ser uma segurança afiançada pelo SUAS, é também uma ação inerente a todo técnico do SUAS, em observância aos princípios éticos deste sistema.
- A Segurança de Renda se efetiva por meio da oferta de benefícios financeiros e continuados para as pessoas que estão foram do sistema contributivo e que se encontram em situação de vulnerabilidades decorrentes do ciclo de vida, por incapacidade de vida independente, ou por exclusão ao mundo do trabalho impedidos temporariamente de subsidiar economicamente os mínimos sociais necessários para vida diária, como no caso do Bolsa Família.
Uma característica relevante da segurança de renda é que a destinação monetária de rendimento não é uma compensação do salário insuficiente, mas a garantia que todas as pessoas tenham condições financeiras de sobrevivência, independentemente de sua conjuntura.
- A Segurança de Convívio ou Convivência Familiar, Comunitária e Social se refere diretamente à dimensão relacional, o reconhecimento que o sujeito se
constitui na relação com o outro, no coletivo, enquanto ser social.
Parafraseando Paulo Freire, é no movimento coletivo, de mutualidade, que se aprende diferentes saberes, importantes e constituintes da vida e do processo de relações educativas e de proteção social.
À medida que as pessoas se relacionam, torna-se possível a construção de identidade e fomenta o processo de escolhas e de autonomia, a medida em que experienciam outros elementos alheios aos seus. Os sujeitos se constituem a partir das diferenças.
Conviver com determinados grupos, que integram a mesma conjuntura, permite a prevenção de situações de riscos, perigos e incertezas que possam acarretar a realidade comum a este grupo.
A segurança de Convívio, seja familiar ou seja comunitária, supõe a não aceitação da perda das relações, sendo que a Política de Assistência Social, no afiançamento da segurança de convívio, considera a “dimensão multicultural, intergeracional, interterritoriais, intersubjetivas, entre outras, devem ser ressaltadas na perspectiva do direito ao convívio.” (PNAS, 2004, p. 26).
Conviver é um direito humano.
- A segurança do Desenvolvimento de Autonomia é focada no protagonismo e emancipação da população atendida. Esta segurança está diretamente ligada à possibilidade de a pessoa realizar escolhas existenciais.
Para este direito ser exercido pela população é necessário que o Estado dê condições anteriores no campo da proteção. Para que haja a capacidade de escolha é preciso que este tenha acesso a certas condições materiais básicas de existência.
A dimensão pedagógica da política de assistência, além de possuir o afiançamento direto dos direitos socioassistenciais inerentes à si, também traz o debate da responsabilidade estatal em garantir subsídios para o desenvolvimento da autonomia.
- Segurança de Apoio e Auxílio se efetiva nas respostas à população que esteja submetida a questões circunstanciais e que necessitam de atendimento pecuniário para sanar a situações temporárias, com provisões suplementares e provisórias.
Esta segurança se consolida sob responsabilidade do Estado e dos municípios na oferta de bens materiais e pecuniários, por eventualidades advindas de morte, nascimento, calamidade e vulnerabilidade temporária, de caráter transitório, que tenham atingido a um ou todos os membros da família. A este recurso, chamamos de benefícios eventuais do SUAS.
Mas para que a proteção social seja alcançada e consolidada da vida da população a quem dela necessitar, a articulação entre todas as seguranças afiançadas no SUAS é elemento precípuo para início do exercício da proteção, atrelada ainda à articulação com as demais políticas públicas.
“A arte de viver é simplesmente a arte de conviver… simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!”
Mário Quintana
Luciane Dias – Assistente Social
Referências Bibliográficas:
https://www.redalyc.org/journal/5522/552264344007/html/
https://www.scielo.br/j/sssoc/a/cCNMZhBDvzWPPdTYWgWmgXr/?format=pdf
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS2004.pdf